O filho eterno - Cristovão Tezza
Publicado em 2007, “O filho eterno", obra do renomado autor brasileiro Cristovão Tezza, é uma narrativa profunda e comovente que explora as complexidades da paternidade diante de desafios extraordinários. O romance possui um aspecto autobiográfico e mergulha nas experiências do personagem principal, um autor fracassado, ao lidar com a chegada (e rejeição) de seu filho Felipe, portador da síndrome de Down. O livro venceu os principais prêmios literários e a realidade criada por Tezza é impactante.
“Recusa. Recusar: ele não olha para a cama, não olha para o filho, não olha para a mãe, não olha para os parentes, nem para os médicos - sente uma vergonha medonha de seu filho e prevê a vertigem do inferno em cada minuto subsequente de sua vida. Ninguém esta preparado para um primeiro filho, ele tenta pensar, defensivo, ainda mais um filho assim, algo que ele simplesmente não consegue transformar em filho”.
A trama desafia as convenções tradicionais dos romances autobiográficos, oferecendo uma perspectiva sensível e honesta sobre as emoções e conflitos que permeiam a jornada de um pai. A narrativa é habilmente construída, apresentando uma riqueza de detalhes que permite ao leitor mergulhar nas angústias, alegrias e reflexões do autor.
“O problema, ele insiste, é que não há bem um lugar para essa criança na sua vida”.
O protagonista é confrontado com a complexidade da paternidade quando seu filho nasce com síndrome de Down. O autor não hesita em compartilhar emoções cruas e contraditórias, desde o impacto inicial até as nuances de aceitação e amor que se desenvolvem ao longo do tempo. A narrativa é marcada por uma linguagem brutal e introspectiva, explorando temas universais de amor, identidade e superação.
Ao longo do livro, Tezza confronta não apenas as barreiras externas impostas pela sociedade em relação às pessoas com deficiência - nos anos 80, quando Felipe nasceu, os portadores da síndrome de Down ainda eram chamados de “mongoloides”, mas também seus próprios preconceitos e medos. Ele aborda as expectativas e pressões sociais que enfrenta como pai, criando uma história que ressoa com empatia e autenticidade.
“Ele recusava-se a ir adiante na linha do tempo; lutava por permanecer no segundo anterior à revelação, como um boi cabeceando no espaço estreito da fila do matadouro; recusava-se mesmo a olhar para a cama, onde todos se concentravam num silêncio bruto, o pasmo de uma maldição inesperada. Isso é pior do que qualquer outra coisa, ele concluiu — nem a morte teria esse poder de me destruir. A morte são sete dias de luto, e a vida continua. Agora, não. Isso não terá fim.”
"O filho eterno" é uma obra que transcende as fronteiras do tema específico da síndrome de Down, oferecendo uma narrativa tocante que toca a todos os leitores, independentemente de suas experiências pessoais. Cristovão Tezza não apenas compartilha sua jornada íntima, mas também desafia os leitores a refletirem sobre suas próprias concepções de normalidade, felicidade e paternidade. Ao longo da história sentimos uma afeição grandiosa por Felipe.
“Felipe abraça com alguém que se larga ao mundo de olhos fechados. Solta-se no carinho que sente como um cão esparramado-se feliz ao sol da varanda”.
É verdade que a leitura produz um forte incômodo, já que o pai de Felipe não poupa o leitor na hora de expressar a sua decepção com o diagnóstico do filho. Mas o decorrer do livro o autor faz nascer uma profunda emoção, e a história passa longe de tentar “desmistificar o assunto” ou de “falar sobre o preconceito das pessoas”. O próprio narrador expõe o seu preconceito e sua vergonha do filho. O pai chega a pensar na morte do filho. Seus pensamentos chegam a ser cruéis, ele tem vergonha do filho e medo de que as pessoas o pergunte sobre o menino, um reflexo de uma sociedade ignorante e repleta de preconceitos.
“A ideia - ou a esperança - de que a criança vai morrer logo tranquilizou-o secretamente. Jamais compartilhou com a mulher a revelação libertadora”.
Em suma, "O filho eterno" é uma obra-prima literária que vai além da condição especial de seu personagem central, capturando a essência da experiência humana e oferecendo uma visão profundamente comovente e perspicaz sobre o que significa ser pai. Um dos pontos altos do livro é quando Felipe sai de casa e o pai sai para procurá-lo, desesperado, e volta pra casa sem o menino.
“Aqui e agora: voltando para casa sem o filho, o mesmo filho que ele desejou morto assim que nasceu, e que agora, pela ausência, parece matá-lo”.
Cristovão Tezza, com maestria, conduz os leitores por uma jornada emocionante que ressoa muito além das páginas do livro.
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Cristovão Tezza, nascido em Lages, Santa Catarina, em 1952, é um renomado escritor brasileiro. Formado em Letras pela Universidade Federal do Paraná, Tezza iniciou sua carreira literária na década de 1970, conquistando reconhecimento por suas obras marcadas por uma prosa reflexiva e sensível. Autor de romances premiados, como "O filho eterno" (2007), sua trajetória literária também inclui incursões na crítica literária e na docência, sendo professor de Literatura Brasileira na UFPR. Com uma escrita que explora temas complexos e oferece uma perspectiva única sobre a condição humana, Tezza consolidou seu lugar como um dos nomes mais importantes da literatura contemporânea brasileira.