O segredo da alegria - Alice Walker

O segredo da alegria - Alice Walker

"O segredo da alegria" narra a trajetória emocionalmente intensa de Tashi. Oriunda das regiões mais remotas da África e posteriormente transplantada para os Estados Unidos, Tashi tem sua vida permeada por adversidades. Sua história é profundamente marcada pela prática brutal da mutilação genital feminina e pela perda angustiante de sua irmã mais velha.

“Não sabíamos que uma das irmãs de Tashi havia morrido na manhã em que chegamos à aldeia. Seu nome era Dura, e ela havia sangrado até a morte. Isso foi tudo o que disseram a Tashi; tudo o que ela sabia [...]”.

A historia se desenvolve em capítulos curtos. Eu sou particularmente atraída por narrativas envolventes que possuam capítulos breves, pois eles contribuem para um fluxo de leitura mais ágil. Na minha avidez para desfrutar de "apenas mais um capítulo", acabei consumindo metade do livro em questão de minutos.

"O segredo da alegria" aborda um dos tópicos mais angustiantes que já tive a oportunidade de explorar - a mutilação genital feminina. A maneira com que a autora navega por esta temática tão dolorosa e brutal é surpreendentemente sensível, consciente e madura, fornecendo uma nova percepção de como tal conteúdo pode ser tratado com habilidade literária.

Neste romance, somos introduzidos à decisão angustiante de Tashi de submeter-se ao ato de mutilação genital como meio de obter reconhecimento e aceitação dentro de sua comunidade. Contudo, a narrativa expõe as repercussões devastadoras que essa escolha acarreta, não somente para Tashi, mas também para aqueles que compartilham de sua vida.

“Era evidente para qualquer um que ousasse olhar em seus olhos que sua alma tinha sofrido um golpe mortal."

A história é contada de forma polifônica, proporcionando-nos um vislumbre da vida de Tashi antes e após a circuncisão. Alice Walker habilmente desmascara uma comunidade que se esconde atrás da justificativa de manter tradições, ao enganar e coagir meninas e mulheres a aceitar e até mesmo apoiar esse ato desumano.

“Mulheres que não são castradas têm uma voz diferente, eu acho. Elas podem soar alegres. Uma mulher castrada, não.”

"O segredo da alegria" conduz o leitor por um itinerário emocionalmente extenuante, no qual o processo físico e psicológico doloroso repercute em todos que se cruzam no caminho da protagonista, Tashi. Mesmo que a personagem tenha surgido no aclamado romance "A cor púrpura", a leitura de "O segredo da alegria" se mantém independente e não requer o conhecimento prévio da obra anterior.

A trajetória de Tashi é narrada por diversas vozes, cada capítulo apresentando a perspectiva de uma personagem diferente que contribui para a construção da narrativa. O relato se torna ainda mais cativante graças a essa multiplicidade de olhares. Acompanhamos não somente a perspectiva de Tashi, mas também da amiga que se tornou sua irmã, do marido, da amante deste, dos profissionais de saúde mental que a acompanham, e de seu filho Benny, um jovem com deficiência intelectual enfrentando um mundo capacitista, entre outros.

A estrutura narrativa não-linear instiga o leitor, despertando a curiosidade sobre o que aconteceu antes e o que acontecerá a seguir.

"O segredo da alegria" se configura como uma leitura desafiadora e dolorosa, com descrições vivas de momentos de tristeza e dor experienciados pela personagem. As ansiedades e medos de Tashi se fazem presentes a cada página virada, especialmente quando consideramos a temática brutal da mutilação genital feminina, um instrumento de opressão disfarçado de cultura. A obra se coloca como uma denúncia potente do machismo que busca conter o poder feminino por meio de ações que comprometem a segurança e os direitos das mulheres.

“Se mentir para si mesmo sobre sua própria dor, será morta por aqueles que alegarão que você gostou dela.”

Nas notas para o leitor, a autora relata que “muitas garotinhas eram mutiladas com cacos de vidro sujos, tampas de lata, navalhas enferrujadas e facas cegas de circuncidadoras tradicionais” a quem ela da o nome de tsungas (uma palavra africana inventado pela autora).

A autora doa uma parte dos royalites do livro para “educar mulheres e meninas, homens e meninos, sobre as terríveis consequências da mutilação genital, não apenas para a saúde e a felicidade dos indivíduos, mas para toda a sociedade em que é praticada, e para o mundo”.

Esta é uma leitura que provoca desconforto, é árdua de realizar. Desafia nossas sensibilidades, provocando dor e desassossego. No entanto, é um tópico de suma importância e urgência. A experiência de ler este livro revela o quão desligados podemos estar, ignorando os diversos problemas que afligem o mundo enquanto nos mantemos confortáveis em nossa zona de conforto. É, sem dúvida, uma leitura impressionante, desafiadora e ressonante.

“Resistência é o caminho da alegria.”

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Alice Walker é uma escritora notável, mais conhecida por seu romance "A cor púrpura", que ganhou o Prêmio Pulitzer de ficção. Walker é conhecida por suas explorações profundas e sensíveis das vidas das mulheres afro-americanas, geralmente abordando temas como racismo, sexismo e a luta por equidade e dignidade.

Em "O segredo da alegria", Walker continua a explorar questões de identidade, gênero e raça, apresentando personagens ricamente desenvolvidos e cenários que são tão memoráveis quanto provocativos. Ela é uma contadora de histórias habilidosa que habilmente entrelaça o pessoal e o político, oferecendo perspectivas únicas sobre questões sociais e culturais.

Alice Walker, uma das mais proeminentes escritoras dos Estados Unidos, é uma premiada autora de romances, contos, ensaios e poesia. Em 1983, Walker se tornou a primeira mulher afro-americana a ganhar um Prêmio Pulitzer de ficção com seu romance The Color Purple , que também ganhou o National Book Award. Seus outros livros incluem The Third Life of Grange Copeland , Meridian , The Temple of My Familiar e Possuindo o Segredo da Alegria . Em sua vida pública, Walker trabalhou para resolver problemas de injustiça, desigualdade e pobreza como ativista, professora e intelectual pública.